Dossier MZ-0202
Nos tempos coloniais e depois, a exploração sexual das mulheres africanas por colonos brancos e outros era uma expressão de uma relação de poder e uma resposta das próprias mulheres à necessidade de sobreviver numa sociedade duplamente opressiva, em termos de género tal como raça. A situação era ainda mais complicada pelas questões em torno da subjugação erótica do corpo negro.
Missionários cristãos e outros tendiam a considerar qualquer expressão aberta da sexualidade feminina, mesmo dentro da estrutura de rituais “tradicionais” ou seja costumeiros, como socialmente inapropriada. Assim tais rituais correram o risco de serem rotuladas como formas de imoralidade e até prostituição. Durante a Luta Armada, a FRELIMO, apesar de sua retórica moralizante posterior, parece ter inicialmente assumido uma visão pragmática quando convinha: de acordo com Harry West, por exemplo,
… um núcleo do grupo inicial treinado [como mulheres combatentes] eram na verdade prostitutas que haviam trabalhado nos arredores da base militar portuguesa no planalto de Mueda... [e trouxeram] com elas informações valiosas” (“Girls with guns”, 2001, pp. 189-90).
Nos primeiros anos da independência, no entanto, isso mudou, e a FRELIMO adotou um espécie de puritanismo patriarcal em relação às mulheres solteiras e/ou independentes. Após a independência em 1975, mulheres solteiras, mesmo quando empregadas, foramàs vezes presas sob acusação de “comportamento duvidoso” ou seja de serem prostitutas, e foram enviadas aos centros de reeducação. Samora Machel comentou num discurso em 1975 que as mulheres da cidade preferiam virar prostitutas do que pegar uma enxada e trabalhar na produção agrícola. A FRELIMO frequentemente aproveitou das acusações de corrupção sexual como justificativa para demitir – por motivos diferentes – funcionários do partido ou do Estado.
Até 1975, homens brancos sul-africanos e rodesianos frequentavam os distritos da “luz vermelha” nas cidades moçambicanas, como a notória Rua Araújo em Lourenço Marques, onde jovens africanas estavam facilmente acessíveis para sexo transacional. A repressão governamental em meados da década de 1970 fechou os bares e casas noturnas, e o sexo comercial passou para a clandestinidade. Além de um pânico moral em 1982, a questão quase desapareceu até quando ressurgiu nos meados da década de 1990, quando alguns “capacetes azuis” da ONUMOZ estavam acusados da solicitação de meninas menores para prostituição.
Um surgimento mais recente da prostituição infantil foi considerado consequência de uma perda generalizada de coesão social, incluindo fatores como desigualdade de gênero, limitações no acesso pelas meninas à educação e às oportunidades de emprego, a desintegração da família extensa e um incremento de abuso sexual. A prostituição também impactou nas taxas de disseminação do HIV/AIDS.
Foto: Ricardo Rangel, outubro de 1974
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